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Afroturismo: estudante cria projeto que traça rotas da história negra na Paraíba

Uma das rotas fica na cidade de Alhandra, símbolo da Jurema Sagrada. — Foto: Josimar Diniz / TV Cabo Branco


Desenvolvido por aluna da UFPB em 2023, a iniciativa pretende valorizar Cultura e Religião, além de discutir Racismo Estrutural.

Memória é sinônimo de conservação. Na perspectiva histórica os efeitos são múltiplos, a memória serve para evitar a repetição de grandes erros, com base no ado, e para reconhecer a importância de vários povos. Foi nesse viés que surgiu um projeto de valorização da memória negra na Paraíba, através do mapeamento de rotas turísticas que mostram os anteriores desta população.

O Afroturismo é o objeto de pesquisa de Bárbara Tenório, a estudante está no processo de conclusão do curso de turismo na Universidade Federal da Paraíba. Durante os estudos ela descobriu o trabalho de retomada de rotas negras em outros estados e buscou algo semelhante na Paraíba, mas não encontrou. Foi quando decidiu implementar a iniciativa.
“É um projeto importante para que a gente possa construir a identidade brasileira trazendo todas as histórias. Muitas vezes a contribuição da população negra é apagada, as rotas mostram a diversidade de culturas, religiões e memórias espalhadas pelo estado”, relata Bárbara.
Bárbara Tenório é estudante de turismo na UFPB e criou o projeto Sankrota. — Foto: Arquivo pessoal

O Resgate de raízes perdidas ou negligenciadas opera um papel importante na valorização da autoestima coletiva da comunidade negra, e é um dos focos do Afroturismo. O campo age tanto como estudo quanto modelo de negócios, onde as vivências negras são o centro das descobertas que esse tipo de turismo pode proporcionar.

As Rotas mapeadas, a exemplo das que integram o Trabalho de Conclusão de Curso de Bárbara, têm ado e contexto distintos. Em João Pessoa, a estudante mapeou o Ponto de Cem Réis, no Centro. No local onde fica, hoje, o viaduto Damásio Franca, em 1697 foi construído um dos poucos locais em que pessoas negras pudessem professar fé dentro das leis da época: a Igreja do Rosário dos Homens Pretos.

Viaduto Damásio Franca, no Centro de João Pessoa. — Foto: Magno Oliveira / Tv Cabo Branco

A igreja foi demolida na década de 1920, a construção do viaduto foi tida como um marco do progresso da cidade. A demolição sem que se fizesse menção ao que se tinha antes no local foi, para Bárbara, o apagamento de muita resistência.
“Além da igreja em si existia a Irmandade dos Homens Pretos, um grupo que se fortalecia pra combater injustiças. Eles se reuniam no centro da praça e havia manifestações tradicionais como maracatu em datas importantes. Era um símbolo negro na cidade”, explica a pesquisadora.
Ponto de Cem Réis, Centro de João Pessoa, antes da construção do viaduto. — Foto: Arquivo pesquisa

A poucos metros do Ponto de Cem Réis, uma outra praça integra a rota afroturística, a Barão do Rio Branco. O destino é conhecido atualmente por abrigar eventos de samba e cultura popular, onde parte da população negra pessoense se diverte ao som de grandes nomes da música preta do país.

Apelidada de Praça do Chorinho por causa da música, o chão que hoje abriga riso já foi espaço de muito pranto. Numa das extremidades da praça, onde fica o busto do Barão do Rio Branco, esteve, até o século 17, um pelourinho. Lá aconteciam os açoites e enforcamentos de pessoas negras escravizadas.

Praça Rio Branco, Centro de João Pessoa. Na imagem o busto, local onde ficava o pelourinho. — Foto: Clara Rezende

O ponto também era conhecido por ser escolhido por escravistas para compra e venda das pessoas que, na época, eram tidas como mercadoria. Também na Rio Branco foi construída a Cadeia Pública, que de acordo com a pesquisadora Bárbara Tenório é outro reflexo das chagas do povo preto paraibano.
“Depois que a escravidão foi abolida não teve política de reparação, pelo contrário. Algumas leis como a da vadiagem, proibia negros de circularem pela cidade caso não tivessem trabalho formal. Medidas assim fizeram com que a Cadeia Pública fosse um local para trancafiar pretos”, explica.
Num reflexo histórico as prisões seguem ainda abarrotadas de corpos negros. Conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2021, 67,5% das pessoas encarceradas no Brasil são negras. Números como esse e o contexto trazido à tona pela pesquisa afroturística remontam ao conceito de racismo estrutural.

O ado escravagista e os índices que envolvem as condições de vida da população negra atualmente deixam nítidos que a hierarquia racial que oprime uns e privilegia outros está na base da sociedade. O filósofo e escritor Silvio Almeida defende a tese em seu livro:
“Racismo é dominação […] A manutenção deste poder adquirido depende da capacidade do grupo dominante de institucionalizar seus interesses, impondo a sociedade regras, padrões de condutas e modos de racionalidade que tornem “normal” o seu domínio”, afirma Silvio na obra ‘O que é Racismo Estrutural">Por Ana Beatriz Rocha, g1 PB
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MARIO PINHO

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